Os textos desta página são cartas que M. escreve para um amigo que (acho) mora na Europa. Todos os dia de manhã, ela deposita um envelope embaixo da minha porta. Depois de encher as latas do condomínio de bolos de papel, desisti, e resolvi publicar algumas por aqui. Assim, quem sabe, podem algum dia atingir o seu destinatário... Renata Magdaleno

quinta-feira, novembro 25, 2004

Querido F.,

Hoje estou num clima Música Urbana do Legião. "Não há mentiras nem verdades aqui/ Só música urbana...". Minha sala está um caos. A mala em cima do sofá e bolinhos de roupas separados por sacos plásticos. Descobri que, assim, as peças não amassam e eu não tenho lá muito saco para ficar passando roupas em trânsito. Meu avião pra Nova York sai amanhã de noite. O Juarez me ligou querendo me levar até o aeroporto. Disse que Célia já tinha combinado de me levar de carro. Mas vou sozinha mesmo.
Na semana passada saí com ele de novo. Combinamos de comer uma pizza e, depois, regar o papo com uns chopes no Jobi. E lá fui eu sozinha. Peguei um táxi na porta da minha casa e encontrei o Juarez, que não dirige, em frente ao restaurante. A fila estava grande, mas ele não tinha notado que era preciso botar o nome numa lista. E lá fui eu falar com o garçom e ficamos mais de meia hora esperando por um lugarzinho. A pizza veio engordurada, comi assim mesmo, olhando para baixo e vendo se a minha barriga já começava a crescer imediatamente de tanta gordura.
Mas continuava achando que ele estava bonito de camisa amarela, com um sorriso aberto. O chope estava bom. Lá pela meia-noite um casal amigo do Juarez chegou no bar e puxamos duas cadeiras para que sentassem também. Ficou um papo animado, mas mais ou menos uma hora depois, resolvi ir embora. E foi aí que descobri que ia embora sozinha de novo. Nada de companhia até em casa, nada de beijo de despedida ou esticada na minha cama vaporizada com essência de lavanda para ocasiões especiais. O Juarez disse que queria ficar mais, que a gente se encontrava no dia seguinte.
Fui assim mesmo e resolvi que, sozinha por sozinha, ficava era em casa mesmo com minha cachorrinha ou do lado da minha mala andando pelo mundo, que pelo menos não ia ficar com a barriga enorme de chope e pizza. No dia seguinte ele me ligou me chamando para um cinema. Mas eu peguei uma gripe. Na mesma semana, comprei o pacote para Nova York. A minha analista não sabe o que é bom da vida.
Até,
M.

terça-feira, novembro 09, 2004

Querido F.,

Estou pensando em passar dez dias em NY. Aproveitar as minhas milhas e ficar dias caminhando por aquela cidade cinza. Foi esta a impressao que tive quando fui pela primeira vez.
O Juarez me ligou hoje me chamando para sair. Aceitei. Devo estar louca...

Ate,
M.

sábado, novembro 06, 2004

Querido F.,

Me senti como uma adolescente. Juarez me levou para o Bracarense e sentamos numa mesa improvisada no meio da calçada. Ficamos conversando e conversando e, lá pelo meio da noite, descobri que nem uma mesa era. Estávamos apoiando os copo num barril com um pedaço de madeira em cima. E ele me falava da sua rotina, dos passeios que costumava fazer todos os dias pela cidade. Das horas que chegava a passar dentro de um ônibus só para conhecer um boteco lá do outro lado do Rio. Eu ficava lá dizendo que ele entendia muito do negócio, que, depois de visitar a quantidade que ele tinha visitado, já devia saber muito para abrir o seu próprio bar. E o homem lá, falando dos projetos para o futuro, de como ele queria morar numa cidade na beirinha do mar e montar um negócio tranqüilo para seus últimos tantos dias. E o bar fechou e ficamos andando pelo Leblon. Paramos na livraria para folhear revistas e, quando vimos, o sol já estava em cima de nossas cabeças. E o Juarez ficava segurando a minha mão e, de quando em quando, parava um minutinho para beijá-la. Meu coração começou a bater forte e senti um calor bem no meio do peito.
Ele me deixou em casa, me deu um beijo comprido na boca antes de ir embora e... eu percebi que não tinha falado nada de mim a noite inteira. E nem ele tinha perguntado absolutamente nada. Falta de interesse total. Fiquei meio chateada com isso... Logo me deu vontade de arrumar as malas. Ando namorando uma viagem para Nova York. Acredita que depois do 11 de setembro ainda não fui lá?

Até,
M.