Os textos desta página são cartas que M. escreve para um amigo que (acho) mora na Europa. Todos os dia de manhã, ela deposita um envelope embaixo da minha porta. Depois de encher as latas do condomínio de bolos de papel, desisti, e resolvi publicar algumas por aqui. Assim, quem sabe, podem algum dia atingir o seu destinatário... Renata Magdaleno

sexta-feira, janeiro 21, 2005

Querido F.,

Segui seu conselho e falei sobre este meu lado voyeur de mim mesma na análise. Carmem, sempre tão calada, abriu a boca para uma observação simples: as pessoas com estima alta costumam se sentir bem em situações amorosas. Se entregam sem críticas, se achando merecedoras de carinho e amor. Quem tem a estima no pé acaba vendo um lado ridículo em toda a situação. É como se no fundo você achasse que não merece viver nada daquilo. Foi como engolir um caroço de ameixa à seco. Ela deve ter razão. Se eu cortar a unha do pé muito rente acho que perco minha auto-estima, de tão lá embaixo que está.
Saí de lá e entrei numa loja para comprar uma lingerie nova. Queria me sentir desejada, merecedora de uma noite de amor com o namorado, coisa simples, para qualquer mortal. Meu erro foi chegar em casa e experimentar a peça em frente ao espelho. Juro que era um conjunto lindo, de sonho, que nunca na vida eu tinha tido. Todo feito de uma renda finíssima, com um lacinho delicado entre os seios. Mas as coxas rechonchudas, a barriga com pregas e os braços redondos chamam mais atenção do que qualquer sutiã e calcinha. Não consegui olhar pra mais nada a não ser o excesso de gordura. Agora é que perdi ela de vez. Talvez o Vigilantes me salve.