Os textos desta página são cartas que M. escreve para um amigo que (acho) mora na Europa. Todos os dia de manhã, ela deposita um envelope embaixo da minha porta. Depois de encher as latas do condomínio de bolos de papel, desisti, e resolvi publicar algumas por aqui. Assim, quem sabe, podem algum dia atingir o seu destinatário... Renata Magdaleno

quarta-feira, outubro 20, 2004

Querido F.,
Hoje tenho duas coisas para falar. Primeiro, fiquei muito irritada porque a Lucy resolveu convidar o Juarez para nos acompanhar em nossa viagem a ILha Grande. Da para acreditar? Lembra dele? Beberrao. Vive com o nariz vermelho de tanta cachaça, cantando todas as mulheres que passam, com aquele ar de gala decadente. Fiquei revoltada. Tenho certeza de que, mesmo la, no meio do mato e da natureza, Juarez vai encontrar um pe-sujo para passar as noites. E vai varar a madrugada com a barriga encostada no balcao, conhecendo a historia do bar e do dono do estabelecimento inteirinhas. Depois, vai querer nos convencer de que encontrou uma reliquia em plena Angra dos Reis.... Saco!
E nao posso deixar de registrar aqui minha profunda tristeza com a morte de Fernando Sabino. Me senti muito sozinha quando escutei no jornal que ele tinha partido. Grande amigo. Que me ensinou em livros como, "O encontro marcado", que se sentir um marciano em plena Terra nao era privilegio ou dor apenas minha. Que a angustia e aquele vazio dentro do peito, de quem nao descobre o seu lugar, estao presentes em outros coraçoes tambem.
Hilda Hilst, Fernando Sabino..... Era tao bom saber que eles continuavam por aqui, caminhando, produzindo...Mesmo que eu nunca tivesse trocado uma palavra com nenhum dos dois. Era muito bom saber que estavam por perto. Saudades....

Ate,
M.