Os textos desta página são cartas que M. escreve para um amigo que (acho) mora na Europa. Todos os dia de manhã, ela deposita um envelope embaixo da minha porta. Depois de encher as latas do condomínio de bolos de papel, desisti, e resolvi publicar algumas por aqui. Assim, quem sabe, podem algum dia atingir o seu destinatário... Renata Magdaleno

terça-feira, maio 01, 2007

Risadas ao telefone



Não fui eu quem inventou esta história. Li numa crítica de jornal. Destas de cinema. Logo na primeira frase o autor repetia o verso de Vinícius de Moraes: Todo grande amor só é bem grande se for triste. E eu ri da cabeça virar até atrás e parei para me ver assim no espelho, cheia de certezas, olhos cansados de quem já passou da metade da vida. Tirei o telefone do gancho e liguei pra Olga de troça.

- Tá no jornal de hoje. Olha lá.
- Quem assina? O Romeu?
- É! Deve ser ele! Acabou de conhecer a Julieta no baile e se deu conta de que ela é da família inimiga.

E um monte de hahahahahas preenchendo o tempo entre as frases.

- Mas Romeu é um adolescente!!!!

E a gente ria, ria, como quem sabe de tudo. E da crítica do jornal, passamos pro poema do Vinícius.

- Mas ele tava falando que quem se protege da vida perde a melhor parte dela – arrisco a Olga.
- Acho que não. Acho que é coisa de gente apaixonada. Ele sabe que ficar junto vai ser difícil, mas que chegou a um ponto que não tem como ir embora mesmo. O famoso se ficar o bicho pega, se correr o bicho come.

E as duas ficaram em silêncio. Fazendo na cabeça uma retrospectiva dos amores do passado. E desatamos a soltar um bando de nomes: João, Felipe, Tobias, Delfim, Juca, Célio, Anderson, Francisco...

E a Olga empacou no Felipe.

- Verão de 64. Nunca esqueci. Aquele sim. Grande amor... – e um suspiro subiu pelo telefone.

E não me arrisquei a falar, mas me lembrei do Alberto de pronto. Namoro cheio de brigas, que terminava e voltava, terminava e voltava, terminava e voltava. Até que um dia eu arrumei uma mochila enorme e falei pra minha mãe que ia viajar nas férias pro Nordeste. Fiquei três meses pulando de cidade em cidade. Demorei umas semanas na Bahia. Fiz amigos em Fortaleza e voltei no inicinho das aulas. Ele já estava com outra, se casou com ela. Teve três filhos e hoje deve ter uma penca de netinhos. Amorzão. Não esqueço.

Falei pra Olga que a máquina de lavar tinha parado. Tava na hora de estender as roupas. E desliguei o telefone pensando porque afinal de contas a gente só se lembra dos que não deram certo, das histórias cheias de sofrimento. É por que ficamos pensando no que poderia ter sido? Se Romeu tivesse se casado com a Julieta a gente não lembrar mais dele? Vou guardar esta crítica pra ler de novo mais tarde...