Os textos desta página são cartas que M. escreve para um amigo que (acho) mora na Europa. Todos os dia de manhã, ela deposita um envelope embaixo da minha porta. Depois de encher as latas do condomínio de bolos de papel, desisti, e resolvi publicar algumas por aqui. Assim, quem sabe, podem algum dia atingir o seu destinatário... Renata Magdaleno

terça-feira, outubro 18, 2005

Querido F.,

Para mim, a culpa sempre foi de Shakespeare. Romeu e Julieta se conheceram, se apaixonaram, morreram por amor. E foi isso. Um amor único e verdadeiro, porque nem deu tempo da vida mostrar o contrário. E eu li a história ainda na adolescência (quantos anos já não se passaram desde então...) e acreditei que era isso mesmo. Que todo mundo tinha um só e especial amor na vida. Fiquei esperando Romeu escalar a trepadeira e subir na minha janela para um beijo de boa noite. E acho que a culpa só pode ser destes altos edifícios cariocas. Morasse eu em Verona e meu Romeu já estaria esquentando os pés no meu edredon há tempos.
Mas hoje acordei assim, F. Pensando nesta história de amor romântico. Cheguei na sala e Alberto colocava um disco de jazz no som, baixinho, com medo de me acordar. E fiquei lembrando de quantos Romeus já passaram na minha vida. O namoro começava,eu apostava que era aquele e os dias iam, o sentimento crescia, diminuía, morria. E a vida continuava e mais dias passavam, meses talvez, e outro chegava pela porta.
Agora Alberto está aqui. Sem cavalo branco ou escaladas noturnas. E meu coração se sente reconfortado. E dá uma paz enorme saber que ele faz parte da minha rotina. Se só agora encontrei o amor da minha vida? Hoje Romeu e Julieta é só mais uns dos livros que tenho na estante. Ainda acho bom, é verdade. Mas tenho a certeza de que a única solução possível para que o amor da dupla permanecesse eternamente lindo, foi a morte. Sábio Shakespeare. E, só agora, na casa dos cinquenta, descobri isso.
Até,
M.