Os textos desta página são cartas que M. escreve para um amigo que (acho) mora na Europa. Todos os dia de manhã, ela deposita um envelope embaixo da minha porta. Depois de encher as latas do condomínio de bolos de papel, desisti, e resolvi publicar algumas por aqui. Assim, quem sabe, podem algum dia atingir o seu destinatário... Renata Magdaleno

quarta-feira, outubro 26, 2005

Querido F.,

Uma dor de garganta me pegou. Daquelas brabas, que deixam tudo vermelho e dão uma moleza no corpo que você só consegue andar se arrastando. Alberto fez um chá para mim. Juma traz cada vez um brinquedo novo para me distrair. Mas, mesmo com tanto mimo, não consigo ficar em casa. Me arrasto pelas ruas de Copacabana procurando distração. Os lugares que não saem da minha memória. Não que façam parte de forma tão forte assim do meu passado. Eu nem morava em Copa durante a infância, a adolescência e nem no início da vida adulta. Sou de Petrópolis, você bem sabe. Mas me dá uma nostalgia danada passear por estas ruas. Nostalgia dos textos da Clarice, em prédios áridos do Leme. Das histórias do Dapieve no Posto 6. Dos contos do Sérgio Santanna . Da visão profética de Rubem Braga, quando disse que Copa estava na UTI. Que seria invadida por monstros de concreto e que, por lá, a mais estranha das raças humanas ia se proliferar.
Copa das prostitutas chorosas e das beatas madrugadoras. Das velhinhas e velhinhos andando pelas ruas com seus poodles, atropelando pedestres com seus carrinhos a motor. Do glamour do Copacabana Palace e da degradação da Princesa Isabel.
Ando por aqui e me sinto viva. Me sinto menos sozinha, menos isolada, no turbilhão da multidão que não pára de passar. No meio de tudo o que é feio, sujo ou bonito.
Preciso comprar um carrinho a motor.
Saudades...
Até,
M.